Para que a regularização fundiária de interesse social (Reurb-S) consiga avançar no País é fundamental a ampliação dos investimentos públicos e também privados nessa política. Além disso, a Lei Federal 13.465, de 2017, que trata do tema, precisa ser aperfeiçoada, de modo a incluir, entre outros pontos, instrumentos coercitivos que obriguem os gestores a implantarem o Reurb-S nos municípios.
Essa foi a principal tese extraída da audiência pública que a Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou nesta quarta-feira (17/5/23). A reunião foi solicitada pelo deputado Leleco Pimentel (PT), que buscou apresentar os fundamentos do programa no contexto de retomada do Minha Casa, Minha Vida e de recriação do Ministério das Cidades.
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Na avaliação do advogado Thiago Naves, especialista em Direito Urbanístico e Ambiental, o setor público em seus vários níveis não está preparado para atuar na regularização fundiária. Faltam recursos, conhecimento e vontade política, na sua opinião, baseada nas suas experiências em Uberlândia (Triângulo mineiro) e em São Sebastião do Maranhão e São José do Jacuí, estes na região do Rio Doce.
Ele detectou que as duas experiências são bem diferentes. Se em Uberlândia há várias ocupações com conflitos sociais que vão desaguar no Judiciário, nas duas pequenas cidades, a demanda é pela regularização de todo o território municipal.
“A segunda cidade de Minas, até hoje, não conseguiu regularizar nenhum bairro popular, porque não tem vontade de resolver o problema.”
Thiago Naves
Especialista em Direito Urbanístico e Ambiental
Já no caso dos dois municípios menores, de acordo com ele, as comunidades são pacíficas e não há conflitos, mas as prefeituras, por falta de recursos e conhecimento, não conseguem avançar.
Por tudo isso, Thiago Naves defende que a Lei 13.465 seja aprimorada, acrescentando a ela dispositivos coercitivos. “Voltando ao exemplo de Uberlândia, não há nada coercitivo na lei para fazer com que o prefeito e seus secretários cumpram o que está na legislação”, detectou.
Já para auxiliar os pequenos municípios, o advogado propõe mecanismos na lei que garantam verba para o Reurb-S e instrumentos de divulgação e formação para orientar os potenciais alvos do programa. “Na lei, está previsto que os próprios moradores podem requerer a regularização, mas eles não têm esse conhecimento”, concluiu.Play
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“Minha Casa, Minha Vida” pode acelerar a Reurb-S no País
Rádio Assembleia
André Albuquerque, presidente da Terra Nova Regularizações Fundiárias, lamenta que no Brasil ainda se tenha que conviver com resquícios do período colonial: “Em Santos (SP), muitas pessoas que construíram casas em áreas particulares são obrigadas a pagar ‘aluguel de chão’. Por isso, estamos lançando a campanha ‘Diga não ao aluguel de chão’”, divulgou.
Outro sério problema observado na cidade, que se repete País afora é o dos despejos forçados em áreas consolidadas. “Vemos demandas por desocupação de áreas onde pessoas estão há 20 anos e o Judiciário concede a reintegração de posse aos proprietários”, estranhou.
Mas o gestor apresentou uma experiência positiva de regularização fundiária, em Nova Lima (Região Metropolitana de Belo Horizonte). Segundo ele, a Terra Nova atuou na bairro do Galo já estava em processo de reintegração de posse, apesar de 600 famílias terem adquirido lotes no local e 130 já terem construído suas casas. “Aplicamos o Rehurb lá e estamos trabalhando para implantação da infraestrutura”, confirmou.
Por fim, ele sugeriu que as entidades que atuam nessa área busquem recursos também na iniciativa privada, especialmente junto a fundos de investimentos dispostos a auxiliar projetos de impacto social. “Os recursos públicos para regularização fundiária não são suficientes; precisamos do mercado financeiro para complementar. Tem pessoas do bem lá, que podem oferecer o recurso de uma forma amigável”, apostou.Play
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A situação de quem vive em imóveis irregulares em cidades foi tema de uma audiência da Comissão de Assuntos MunicipaisTV Assembleia
Na opinião de dois participantes, os cartórios, como uma das etapas finais da regularização, podem influenciar positivamente ou não esse processo. Enrico Madia, presidente da Comissão Nacional de Regularização Fundiária, afirmou que os Cartórios de Registros de Imóveis são os responsáveis pela emissão da certidão de regularização fundiária. E que os oficiais desses estabelecimentos podem travar o processo se fizerem uma interpretação muito restritiva das leis envolvidas.
Mais radical, João Costa Filho, ex-conselheiro da Região Metropolitana do Vale do Aço, acredita que os cartórios sejam instrumentos do status quo para manter a situação fundiária sem avanços. Com isso, sua atuação acaba por fazer com que os processos de regularização fundiária sempre esbarrem em dificuldades.
Para enfrentar esse e outros desafios, conta Enrico Madia, foi criada a Comissão Nacional de Regularização Fundiária, visando reunir profissionais, entre advogados, arquitetos, topógrafos, engenheiros e outros para discutir as melhores práticas nessa área. Ele divulgou estudo da Unicamp de 2016 apontando que a irregularidade fundiária no Brasil traz perdas da ordem de 10% do PIB.
O vereador de Uberlândia Igino Oliveira analisou que a questão fundiária brasileira remete a nossa história de injustiça e exclusão. “É fácil saber numa cidade quem são os herdeiros dos amigos do rei de Portugal: são os que tem propriedades regularizadas; os demais são os que moram em áreas irregulares, sem documento e muitas também sem água e esgoto”, disse.
Mila Costa, presidente da Agência RMBH, disse que a regularização fundiária é prioritária na instituição, que presta assessoria técnica para os 34 municípios da região mais os 16 do Colar Metropolitano que queiram fazer regularização fundiária. E a maioria desses municípios não tem equipe técnica para atuar nisso.
Na reunião, o deputado Leleco Pimentel destacou que a regularização fundiária foi tema da dissertação de mestrado formulada por ele. Disse ainda que a Reurb-S consiste na titulação de imóveis ocupados informalmente por pessoas de baixa renda em áreas urbanas, com o objetivo de assegurar o direito à moradia e evitar conflitos pela posse dos terrenos.
Por outro lado, ressalvou que a Lei 13.465, apesar dos avanços, tornou-se um “Frankenstein”, devido às várias modificações que apontaram para o fortalecimento do direito de propriedade.
Ele também comemorou a volta do Ministério das Cidades e o anúncio do presidente Lula de construir 2 milhões de moradias. “O governo federal nos dá esperança de podermos rever a política de regularização fundiária no Brasil, no caminho da justiça social”, concluiu.